As três vigílias

As cadeiras da sala de jantar no meio da estrada que vai do vilarejo até o barranco, cuidadosamente arrumadas, é uma imagem da qual me lembro, mas não tenho certeza se realmente aconteceu. Naquela época, morávamos em Cumbitara, a casa ficava no pé da estrada e bem no início da colina. No meio daquela paisagem, os móveis domésticos estavam instalados no maior silêncio, e foi assim que aquela imagem acabou me acompanhando, sem saber muito bem o que ela significava. A partir de minha prática artística, a ideia de uma paisagem híbrida tornou-se recorrente, reconstruída e ressignificada por elementos que lhe eram estranhos, mas ao mesmo tempo acolhidos com tanta naturalidade, como se tivessem sido predestinados para aquele lugar. 

O nome da obra é dado pela noção de vigília, que tem várias conotações e pode ser de natureza religiosa ou militar, ou um distúrbio sintomatológico do sono. Essa última condição, causada pela insônia, pode produzir alterações na percepção e desencadear estados alterados e ficcionais, típicos da exaustão. Foi assim que, em meio ao descontrole da vigília, começaram a aparecer os sintomas mais fortes da doença psiquiátrica que minha mãe começou a sofrer, provavelmente há mais de 40 anos, e que modificaria a dinâmica afetiva e lógica de nossa convivência.